quinta-feira, 5 de julho de 2012

O despertar do Jaguar solar


Na cidade-templo de Chavin de Huantar, no Peru, vivia um menino chamado Tukano. Ele gostava de correr pelos templos e praças de seu povo, que eram adornados com esculturas de pedras com forma de animais e seres fantásticos. Habituou-se a “conversar” com as esculturas de felinos, águias, falcões e serpentes, como quem inventa histórias e contos. O menino sentia uma grande atração por aquelas figuras, embora algumas lhe causasse medo.
Um dia, Tukano foi muito cedo para o templo e passou o dia todo brincando com as esculturas. Pela primeira vez sentiu como se os animais tivessem vida, “ouviu” vozes e “sentiu” movimentos. Naquela noite, impressionado pelo que havia visto e ouvido no tempo, o menino teve um sonho… Apareceram as figuras da águia e do falcão e lhe disseram:
- Tukano, teu povo está em perigo. Será atacado por gente do norte. Têm que estar preparados.
No dia seguinte, acordou sentindo-se muito intranqüilo. De imediato foi ver o Xamã, que tinha grande sabedoria, se comunicava com os espíritos e curava as pessoas. O menino sabia que o Xamã podia ajudá-lo.
- Xamã – disse Tukano –, de noite sonhei que nosso povo vai ser atacado por homens de outros lugares, que provocarão uma grande guerra. Que devemos fazer?
- Não te preocupes – contestou o Xamã –, essa é o sinal dos espíritos que eu estava esperando.
- Mas, Xamã – insistiu Tukano, ainda muito inquieto –, como vamos nos defender?
- Mantenha a calma, Tukano – respondeu o Xamã –, tranqüiliza teu coração. Deixa isso em minhas mãos.
Então o Xamã reuniu todo o povo; fizeram um grande fogo e começaram a tocar tambores e outros instrumentos. O Xamã bebeu uma poção mágica e, usando uma máscara de jaguar, foi para o centro do grupo e começou a mover-se no compasso da música. De repente, jogou a cabeça prá trás, estufou o peito e começou a dançar.
Tukano, com os olhos muito abertos, estava assustado. Era a primeira vez que assistia a essa cerimônia.
Enquanto isso, o Xamã continuava a mover-se, curvando os ombros para trás e o ventre para cima. Pouco a pouco sua pele foi mudando de cor, tornando-se amarelada e com manchas negras. Seu rosto começou a alterar-se: os dentes cresceram e sua mandíbula ficou mais protuberante, assim como sua musculatura tomou características ferozes. Os pés e as mãos tornaram-se patas de jaguar, com aquelas temíveis e afiadas garras.
Tukano já não cabia em si de assombro. Finalmente o Xamã se transformou completamente em jaguar.
Quando Tukano viu o jaguar compreendeu que já não corriam nenhum perigo, porque agora era este felino quem os defenderia. Tukano, muito tranqüilo, entendeu que estavam a salvo. Nada nem ninguém poderia vencer o jaguar. Este era o animal mais forte, poderoso e feroz da Terra. Com sua velocidade e força poderia combater quem quisesse atacá-los.
O rugido do jaguar era a voz do trovão, e sua cor representava o poder do Sol na Terra. E foi o próprio Sol que lhe confiou que cuidasse e protegesse sua criação. Além disso, o jaguar tinha a habilidade de ver de noite, o poder de mover-se pelas cavernas, por baixo da terra e sobre sua superfície, e em árvores. Com esses poderes podia atuar como intermediário entre os Espíritos da terra e do céu, e vencer qualquer inimigo.
Mas Tukano também entendeu que seu sonho significava que ele seria o sucessor do Xamã. Compreendeu que a atração que sentia pelas esculturas do templo era um sinal de que os Espíritos o haviam escolhido e estavam se comunicando com ele. Que assim ele estava adquirindo poderes e sabedoria para comunicar-se com os Espíritos. E um dia, quando fosse grande, poderia ser ele o próximo xamã e transformar-se em jaguar.
Adaptado do conto de Ana María Pavez Recart.

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